Capitão Vaz conta que missão era resgate de policiais encurralados. Segundo ele, aeronave teria sido atingida por mais de oito tiros.
Uma semana depois de conseguir pousar um helicóptero em chamas depois de confronto armado no Morro dos Macacos, em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio, o piloto Marcelo Vaz refez o trajeto da aeronave e lembrou em detalhes a operação, que acabou com três policiais, companheiros de tripulação, mortos.
Na manhã de sábado (17), os helicópteros Fênix 2 e 3, da Polícia Militar, saíram para dar apoio aos policiais cercados por traficantes na favela. Na noite anterior e durante a madrugada, segundo a polícia, mais de cem bandidos do morro São João tinham invadido o morro dos Macacos para tomar os pontos de tráfico. Os policiais encontraram fogo pesado em todas as frentes.
“Quando estávamos subindo também encontramos ali cerca de 30 a 40 bandidos que estavam descendo já da comunidade para uma fuga”, relembra o capitão, que chegou a resgatar dois policiais feridos e estava voltando para dar reforço à operação quando o helicóptero foi atingido.
“Estávamos contornando a pedra. Era o momento em que eu tinha decisão de sair, só que infelizmente eu já saí alvejado”, conta Marcelo Vaz.
Helicóptero teria levado mais de 8 tiros, diz piloto
De acordo com ele, toda a tripulação sentiu o impacto dos tiros na aeronave e é difícil precisar quantas vezes ela foi atingida. “Difícil mensurar, mas acredito que tenha sido de seis a oito tiros ou mais”, diz.
Com o helicóptero em chamas e seis vidas a bordo, ele resume como estava o clima da equipe: “Desesperador”. “Meu copiloto, eu sabia que estava baleado, mas quem estava atrás, a tripulação, eu não sabia quem propriamente estava baleado. Eu ouvia ‘fogo, tô baleado’”, lembra o piloto.
Sangue frio
Para Marcelo, o ato de heroísmo ficou por conta do treinamento que recebeu e o ensinou a manter o sangue frio. “Gritando fogo, gente ferida, o outro helicóptero chamando pelo rádio, como é possível manter o sangue frio? Eu procurei me desligar daquilo e levar a máquina para o pouso”, conta o capitão, que fez operações de salvamento nas enchentes de Santa Catarina, ano passado, e, há três semanas, refez o curso de emergência em voo.
Num primeiro momento, conta ele, a ideia era pousar em uma empresa de ônibus próximo ao local. “Só que no caminho esse ponto vislumbrou. Eu falei: é ali que eu vou pousar”, lembra, afirmando que isso deve ter durado apenas cerca de 90 segundos.
“Se não tivesse conseguido seria uma tragédia, famílias que não tinham nada a ver com aquele confronto, era um sábado com muita gente em casa. Dormindo ainda, 9 horas da manhã”, diz Marcelo Vaz.
Combustível cortado
De acordo com o piloto, o motor do helicóptero teria sido atingido pelo fogo já próximo ao campo em que pousou. “Estava na final, a minha luz, as luzes se acenderam, foi o momento que cortei o combustível e fui pra autorrotação”, afirma o piloto. Na autorrotação, o helicóptero conta apenas com o movimento que continua nas pás, para se sustentar. Para controlá-lo o piloto levanta o bico, e vem descendo até ajeitar e pousar.
“Senti calor no pouso, porque em deslocamento a labareda estava para trás.Quando eu fui pousar, redução de velocidade, o fogo veio para frente também. O Marcelo Mendes, meu copiloto, estava com o macacão pegando fogo nas pernas. Ajudei-o a apagar, falei pra ele retirar o macacão, ele tirou e foi apagar o incêndio do Patrício. Fui com ele, foi nesse momento que queimei a mão. O cabo Anderson Fernandes estava me chamando para tirá-lo de perto da aeronave. Fui lá e consegui puxá-lo. Ele estava com um tiro na perna”, relembra Marcelo Vaz.
Colegas mortos
O cabo Izo Patrício, socorrido pelo outro helicóptero, não resistiu às queimaduras em 80% do corpo e morreu dois dias depois. Os soldados Edney Canazaro e Marcos Stadler não conseguiram deixar o helicóptero e morreram no local.
“A memória que eu tenho de cada um deles, é uma memória muito agradável: o Patrício era uma pessoa muito brincalhona, familiar; o Canazaro, uma pessoa muito séria, gostava de esportes, amigo. O Standler, uma pessoa muito culta, fala pouco, um cara bem respeitador, íntegro. É isso que eu levo deles”, diz Marcelo Vaz, que fala da memória mais forte do episódio: “A dor dos familiares. A gente não considera a perda de um policial. A gente considera a perda de um companheiro, um pai de família, um amigo”.
Fonte: G1
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