Correa, com uma máscara contra os efeitos do gás lacrimogênio, é atendido ao sair do regimento policial de Quito. Ele foi levado para o hospital/AFP
Centenas de agentes das forças de segurança do Equador saíram às ruas da capital Quito e ao menos outras duas cidades em um protesto em massa contra uma lei do governo que limitou os benefícios econômicos a militares e policiais. O aeroporto de Quito foi fechado e suas operações canceladas após uma pista ser tomada por cerca de 120 militares que estariam apoiando os protestos e a imprensa equatoriana afirma que policiais tomaram a sede do Congresso.
O presidente equatoriano, Rafael Correa, foi duro em suas declarações aos policiais e disse que os manifestantes "são um grupo de bandidos ingratos". O chefe das Forças Armadas, o general Ernesto González, manifestou apoio integral ao presidente e reiterou que ele é autoridade máxima do país. As informações são desencontradas e não se sabe ainda a extensão do apoio dos militares aos protestos dos policiais.
Presidente do Equador, Rafael Correa, discursa na TV; "Se quiserem matar o presidente, aqui estou, matem-no!"/AFP
Durante o protesto, os policiais lançaram bombas de gás lacrimogêneo e queimaram pneus após tomar bases em Quito e Guayaquil. A agência de notícias France Presse, que cita a porta-voz do Legislativo, Julia Ortega, diz que a sede do Congresso do Equador foi tomada em Quito por policiais.
O ministro coordenador de Segurança Interna e Externa equatoriano, Miguel Carvajal, afirmou que a situação é "delicada" e que os protestos constituem um processo de "desestabilização do governo e da democracia".
Em entrevista ao canal Telesur, Correa não descartou decretar estado de emergência no país e insinuou que os protestos são uma medida da oposição para desestabilizar seu governo.
Mais cedo, em uma tentativa por apaziguar o protesto, Correa foi ao regimento número um de Quito, mas, depois de ser vaiado pelos manifestantes, acabou por desafiar os militares e policiais. Correa saiu carregado em meio a distúrbios e uma nuvem de gás lacrimogêneo.
Presidente Rafael Correa é carregado com máscara de gás e muleta após sofrer ataque com gás lacrimogêneo/Rodrigo Buendia/AFP
Apoiado numa muleta pelo fato de que foi submetido há pouco a uma operação no joelho, o presidente conseguiu sair do quartel usando uma máscara de proteção e ajudado por seguranças depois da explosão de várias bombas de gás lacrimogêneo, segundo um jornalista da agência de notícias France Presse no local. Correa foi levado para o hospital da polícia, onde foi atendido com sintomas de asfixia pelo gás. Do lado de fora, dezenas de policiais continuavam protestando.
Correa advertiu aos policiais que não cederá ante os protestos da polícia, que rejeita a lei aprovada pelo Congresso eliminando benefícios aos membros dessa instituição e das Forças Armadas. "Não darei nenhum passo atrás. Se quiserem, tomem os quartéis, se quiserem deixar a cidadania indefesa e se quiserem trair sua missão de policiais", afirmou Correa em uma acalorado discurso ante dezenas de militares que tomaram o principal regimento de Quito.
"Se quiserem matar o presidente, aqui estou, matem-no se tiverem vontade, matem-no se tiverem poder, matem-no se tiverem coragem ao invés de fiar covardemente escondido na multidão", afirmou ainda. "Se quiserem destruir a pátria, aí está! Mas o presidente não dará nem um passo atrás".
Presidente do Equador, Rafael Correa (2º à direita) tenta dialogar com manifestantes no local de protestos na capital do país/Rodrigo Buendia/AFP
Paralelo a isso, cerca de 150 membros da Força Aérea Equatoriana (FAE) tomaram o aeroporto internacional de Quito. "Cerca de 150 efetivos da Força Aérea Equatoriana tomaram a pista do aeroporto Marechal Sucre e também a rua na entrada", afirmou à rádio Quito o porta-voz da empresa administradora Quiport, Luis Galárraga.
Os agentes também protestam em outros quartéis de Guayaquil (sudoeste) e Cuenca (sul), segundo informes policiais, mas a manifestação mais numerosa acontece na capital.
Para entender a crise
Rafael Correa tenta se equilibrar em muletas em meio a nuvem de gás lacrimogêneo (esq); e, aparentemente desacordado, é carregado por auxiliares durante protesto de militares/AFP
A crise tomou conta do Equador nesta quinta-feira (30), quando soldados assumiram o controle do principal aeroporto do país e policiais protestavam nas ruas. Outro grupo de policiais invadiu a sede do Congresso, revoltado contra uma lei que cortou benefícios econômicos aos membros dessa instituição e das Forças Armadas.
O motim acontece no momento em que o presidente Rafael Correa analisa a possibilidade de dissolver o Congresso, em meio ao impasse político. O presidente denunciou que seu governo é vítima de uma "tentativa de golpe de Estado" por parte de setores opositores e das Forças Armadas próximos ao ex-presidente Lucio Gutiérrez.
Em entrevista por telefone à rede regional Telesur, o chanceler equatoriano, Ricardo Patiño, declarou que os protestos "intoleráveis" protagonizados por grupos de policiais no país não têm o respaldo da população.
- Uma decisão totalmente inaceitável de parte de alguns setores policiais, não de todos [...]. O povo não está apoiando isso, o povo está se mobilizando em favor de seu governo, legitimamente em vigor.
Policiais protestam por causa da eliminação de benefícios econômicos para a tropa incluídos em uma reforma legal. A manifestação se estende aos poucos por todo o país e ameaça submeter a nação ao caos
No campo político, membros do próprio partido de Correa, de esquerda, estão bloqueando no Legislativo projetos que buscam cortar custos do Estado. Isso levou o presidente a considerar a dissolução do Congresso, medida que lhe permitiria governar por decreto até as próximas eleições, disse um dos ministros.
Equador tem histórico de instabilidade política
O país, de 14 milhões de habitantes, tem uma longa história de instabilidade política.
Em cenas confusas e caóticas em Quito, centenas de soldados tomaram a pista do aeroporto internacional da cidade, que foi fechado para os voos.
Um telefonista informou que o aeroporto está fechado. Muitos trabalhadores estão sendo enviados para casa, e escolas foram fechadas devido ao tumulto.
Em outras partes da capital, policiais uniformizados queimavam pneus em protesto contra uma proposta de corte de benefícios da categoria.
Constituição prevê dissolução do Congresso
A Constituição do Equador, instituída há dois anos, permite que o presidente declare um impasse político e assim promova a dissolução do Congresso até a realização de novas eleições presidenciais e parlamentares.
No entanto, a medida teria de ser aprovada pela Corte Constitucional para entrar em vigor. Depois de se reunir com Correa e outras autoridades na noite de quarta-feira (29), a ministra da Política, Doris Solis disse que ainda não foi tomada nenhuma decisão.
- Este é um cenário que não agradaria a ninguém, mas é uma possibilidade quando não existem as condições para a mudança [...]. Ainda não foi tomada uma decisão.
Mas o chefe do comando das Forças Armadas, Ernesto González, garantiu em um pronunciamento na TV que os militares estão subordinados à autoridade do presidente.
- Estamos em um Estado de Direito. Estamos subordinados à máxima autoridade que é o senhor presidente da República.
Protestos nesta quinta-feira (30), no Regimento de Polícia Número, em Quito./AFP
OEA se reúne em caráter de emergência para debater crise no Equador
O Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) se reunirá de forma extraordinária nas próximas horas para tratar dos protestos que tomaram conta do Equador, disse nesta quinta-feira, 30, o secretário-geral da entidade, José Miguel Insulza.
Em entrevista ao canal estatal chileno TVN, Insulza adiantou que depois da reunião do comitê da OEA haverá uma declaração de apoio ao presidente do Equador, Rafael Correa. "É muito lamentável, mas temos confiança que o governo do Equador vai controlar a situação", disse Insulza. Ele não descartou viajar ao Equador "se for necessário, mas é uma decisão que será tomada mais tarde".
Militares e policiais tomaram o Congresso, o aeroporto de Quito e vários quartéis do país em protestos contra reformas pretendidas por Correa quando aos benefícios recebidos pelo efetivo das forças de segurança. Correa acusou a oposição de tentar derrubá-lo com um golpe de Estado.
Apoio
A Argentina declarou apoiar Correa e expressou sua "confiança na institucionalidade democrática do país irmão e na autoridade política do presidente constitucional para encontrar o melhor caminho em defesa dos interesses do povo e do governo equatorianos", informou um comunicado da chancelaria de Buenos Aires.
O secretário-geral da União das Nações Sul-americanas (Unasul), o ex-presidente argentino Néstor Kirchner, expressou seu "firme compromisso e a mais absoluta solidariedade" com Correa. Kirchner lamentou "a tentativa de sublevação da ordem constitucional de setores corporativos das forças de segurança" e disse que "nenhuma nação sul-americana pode tolerar governos eleitos democraticamente que sejam ameaçados por setores que não querem perder privilégios".
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, o maior aliado de Correa, denunciou a tentativa de golpe de Estado contra o mandatário equatoriano e pediu aos países da Unasul e da Aliança Bolivariana das Américas (Alba) que fiquem "alertas". "Estão tentando derrubar o presidente Correa. Alerta Unasul! Alerta Alba! Viva Correa!", escreveu o venezuelano em sua conta no Twitter.
O chanceler brasileiro, Celso Amorim, comunicou ao ministro de Exteriores equatoriano, Ricardo Patiño, a solidariedade do governo brasileiro "com o governo e com a democracia no Equador". Amorim disse que "tomou conhecimento com preocupação das manifestações no país", segundo um comunicado do Itamaraty, no qual transmite "total apoio às instituições democráticas do Equador".
O comunicado também diz que o presidente Lula se mantém informado da situação, inclusive "sobre ações em curto para uma resposta firme e coordenada do Mercosul, da Unasul e da OEA". Essas ações, segundo a chancelaria brasileira, "repudiaram qualquer desrespeito à ordem institucional deste país irmão".
O governo da Colômbia também se mostrou solidário com a situação no Equador. "O único governo que a Colômbia reconhece é o de Rafael Correa", disse o vice-presidente colombiano, Angelino Garzón. A chanceler colombiana, María Angela Holguín, disse que espera "uma normalização da situação no Equador o mais rápido possível".
No Chile, o presidente Sebastián Piñera também colocou o país à disposição do Equador no que diz respeito à defesa das instituições democráticas. "Declarei ao presidente Correa, ao povo equatoriano, à ordem constitucional e à democracia no equador o mais absoluto apoio do governo de Santiago", disse.
O governo da Espanha também expressou seu total apoio ao presidente equatoriano. A chancelaria espanhola difundiu um comunicado no qual expressa o apoio às autoridades legítimas e instituições democráticas equatorianas e condena "qualquer ruptura da legalidade constitucional".
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Fontes: FOLHA - G1- R7 - Época - Agências - O ESTADO DE S PAULO - CNN
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