Nas asas da especulação

Quem estava por dentro da fusão entre TAM e LAN comprou grandes lotes de ações antes do anúncio da operação ao mercado. Será que a CVM vai agir desta vez?

Arremetida: notícia da fusão saiu no fim da tarde do dia 13 de agosto e causou uma alta de mais de 30% nas cotações da TAM PN/Arte: Isto É Dinheiro

A fusão entre a brasileira TAM e a chilena LAN, anunciada em uma cabalística sexta-feira 13, gerou a maior empresa aérea da América Latina e representou um dos maiores negócios do ano.

Negócios desse porte costumam tumultuar o mercado financeiro, não apenas pelos expressivos valores envolvidos, mas também porque as duas empresas envolvidas possuem ações negociadas na bolsa de valores. Não por acaso, os papéis da TAM apresentaram uma movimentação incomum no dia em que a transação foi divulgada.

Do início do ano até a véspera do anúncio, foi negociado em média um milhão de ações preferenciais da TAM por dia, representando um giro financeiro de R$ 32 milhões. No dia do comunicado, o giro financeiro subiu oito vezes, para R$ 265 milhões. No pregão seguinte, a segunda-feira 16, o giro avançaria novamente para R$ 610 milhões, 18 vezes mais do que a média.

Foi uma movimentação tão atípica que chamou a atenção do mercado e levantou algumas suspeitas – até agora, repita-se, apenas suspeitas. Dados obtidos pela DINHEIRO indicam que as corretoras líderes na negociação de papéis da TAM na sexta-feira 13 foram a BTG Pactual, a Credit Suisse e a CS Hedging Griffo, as duas últimas pertencentes ao mesmo grupo.

No caso do BTG Pactual, dois dados são relevantes. O primeiro, o fato de o controlador do banco, André Esteves, ser membro do conselho de administração da TAM, desde 2009. O segundo é que seu banco assessorou a TAM na operação com a LAN.


"Não compramos nada. Isso é sério no Brasil, dá cadeia" André Esteves, do BTG Pactual/Isto É Dinheiro

Pode ser uma mera coincidência, mas a movimentação foi tão alta que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o xerife do mercado – que tem como função investigar casos atípicos –, emitiu uma nota informando que passaria a analisar a operação.

Ainda que seja o procedimento padrão da CVM em qualquer fusão, no caso da TAM isso revela a atenção que a operação levantou no mercado. Consultado, o Credit Suisse presidido por Antonio Quintella não fez comentários, informando que o analista responsável pelo acompanhamento das ações da TAM não estava disponível.

No caso do BTG Pactual, o controlador rechaçou qualquer especulação sobre condutas irregulares do banco. “Todos os fundos do BTG Pactual estavam proibidos de negociar ações da TAM”, disse Esteves com exclusividade à DINHEIRO. “Não compramos nada, isso é sério no Brasil, dá cadeia.” Por meio de sua assessoria, o banco informou também, em um e-mail enviado à DINHEIRO, que “a corretora do BTG Pactual simplesmente executa ordens de compra e venda de papéis feitas por seus clientes”.


O BTG não informa quais clientes enviaram as ordens. Podem ser fundos de investimento, podem ser investidores de alto poder aquisitivo, podem ser empresas controladas por executivos do mercado financeiro e localizadas em paraísos fiscais, a salvo das perguntas indiscretas da CVM. O fato é que as operações da sexta-feira 13 geraram ganhos expressivos para os investidores que se anteciparam à notícia da fusão. Nesses momentos, muitos investidores costumam comprar ações para aproveitar-se do interesse pela nova empresa.

Espera-se que, unidas, duas empresas grandes tenham economias de escala, obtenham ganhos de sinergia e exibam lucros maiores depois de algum tempo. Assim, não surpreende que o interesse dos investidores tenha feito as ações da TAM subir mais de 30% no dia do anúncio.

As três corretoras intermediaram compras e vendas de 3,4 milhões de ações da TAM, 40% dos negócios do dia. As compras superaram as vendas em 1,46 milhão de ações nas três corretoras (volte a página e observe o gráfico). A animação continuou na segunda-feira 16. Nessa data, primeiro pregão após a confirmação oficial da criação da Latam, as três corretoras intermediaram a negociação de 5,1 milhões de ações PN da TAM.

A diferença foi que, desta vez, os clientes pediram para vender. As vendas superaram as compras em 607 mil ações, segundo uma pesquisa realizada no sistema de informações de mercado Datatrader com exclusividade para a DINHEIRO (observe, de novo, o gráfico).

Na sexta-feira 13, boa parte das ordens foi enviada durante a manhã e o começo da tarde, antes que a fusão fosse divulgada ao mercado. Os clientes das corretoras compraram as ações por preços entre R$ 28 e R$ 29 em média, sendo que, no fim do dia, esses papéis já valiam R$ 36.

Na ponta do lápis, quem comprou de manhã e vendeu no fim da tarde embolsou um lucro de 28% antes de acabar de digerir o almoço. A valorização foi tão expressiva que chegou a alterar a classificação dos fundos de ações – o fundo Humaitá Value, que amargava uma perda de 10% no ano, reduziu sua baixa para 4%.

A bonanza também chegou aos fundos do Credit Suisse – um deles, o Credit Suisse Cabra FI, amargava uma leve queda até o dia 12 de agosto. A partir do dia 13, a rentabilidade do fundo passou para o azul, algo nada desprezível em um ano tão ruim para as ações como um todo.

Até o dia 6 de agosto, segundo dados publicados pela CVM, o fundo não possuía ações da TAM em sua carteira – tinha ações da concorrente Gol. No entanto, nem todos os nomes das empresas em que o fundo investia são divulgados.

Pode ser que todos esses fatos sejam meras coincidências. Conglomerados financeiros de grande porte, como o Credit Suisse e o BTG Pactual, realizam inúmeros negócios ao mesmo tempo e existe a possibilidade de que as negociações frenéticas das corretoras não tenham relação com o fechamento do negócio.

No entanto, mesmo concedendo-se aos bancos o benefício da dúvida (ou da coincidência), cabe comparar sua atitude com a do J.P. Morgan, que assessorou a LAN. Na véspera, no dia e no dia seguinte, o banco – coincidentemente – não negociou ações da TAM.


Fonte: Isto É Dinheiro/ Cláudio Gradilone e Márcio Kroehn

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