Especialistas divergem sobre como medir a dispersão das cinzas vulcânicas e sobre quem deve decidir quando é seguro viajar de avião, enquanto milhões de viajantes permanecem no solo e os prejuízos superam US$ 1 bilhão (cerca de R$ 1,7 bilhão) em razão da crise provocada pelas cinzas do vulcão na Islândia.
"Eu chamaria isso de bagunça europeia porque não nos concentramos nos números e nos fatos", disse Giovanni Bisignani, diretor-geral da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata, na sigla em inglês), nesta segunda-feira.
"A Europa estava usando uma abordagem matemática teórica e não é isso de que se precisa. Precisávamos de que alguns voos de teste fossem feitos para avaliar o nível de cinzas para tomar decisões", completou ele.
A British Airways, a Air France e a KLM afirmaram ter feito voos de teste e não terem encontrado dificuldades com as cinzas.
Há uma grande diferença de opiniões entre os especialistas acadêmicos e os das companhias aéreas, mas a principal autoridade da União Europeia (UE) para os transportes disse que a UE não faria concessões com relação à segurança.
A Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) levou a ameaça a sério o bastante para limitar os exercícios militares depois de verificar um acúmulo de vidro vulcânico nos motores de um caça.
Danos aos aviões
Arte/Folha
Poucas pessoas contestam o dano que a cinza vulcânica pode provocar dentro de uma turbina moderna, depois que um jumbo da British Airways evitou um desastre por pouco na Indonésia em 1982, quando todas as suas quatro turbinas pararam de funcionar em razão de cinzas.
As cinzas vulcânicas contêm minúsculas partículas de pedra e silicatos que podem arranhar as superfícies aerodinâmicas e instrumentos e formar uma camada como se fosse de vidro dentro do motor.
Bisignani disse que os governos erravam ao impor a proibição das viagens aéreas no norte da Europa e afirmou que os tomadores de decisão deveriam considerar a possibilidade de formar "corredores" para redirecionar os cerca de 7 milhões de passageiros presos ao redor do planeta.
Joachim Curtius, professor do Instituto para Ciências Atmosféricas e Ambientais da Universidade Goethe, em Frankfurt, defendeu a proibição e disse que faria sentido para as companhias aéreas instalar instrumentos nas aeronaves para medir as partículas do ar.
Atualmente, apenas um pequeno número desses instrumentos, que custam dezenas de milhares de euros, é fabricado por ano.
Os pilotos não conseguem ver os bolsões de cinzas e um instrumento medindo as partículas do ar poderia alertar um piloto a tempo de reagir, por exemplo, voando a uma altitude menor, disse ele.
Apenas reduzir a altitude, no entanto, não é garantia de sucesso.
"Você poderia pensar que está seguro voando na faixa dos 6.000 metros em vez dos 12 mil metros, onde estão as cinzas, apenas para descobrir que o vento subitamente diminuiu e as cinzas estão agora em 6.000 metros", disse Stewart John, membro da Academia Real de Engenharia e ex-presidente da Sociedade Real Aeronáutica, do Reino Unido.
Entenda os perigos de voar em nuvens de cinzas vulcânicas
A decisão das autoridades de aviação do Reino Unido de fechar o espaço aéreo do país, nesta quinta-feira, diante da proximidade de uma nuvem de cinzas originada por um vulcão na Islândia, trouxe à tona um perigo relativamente pouco conhecido por passageiros e leigos.
Segundo especialistas, esse tipo de fenômeno é capaz de estragar janelas e estruturas de aeronaves, ou até parar as turbinas dos aviões em pleno voo.
"Se partículas de cinzas vulcânicas entram em uma turbina, elas se acumulam e entopem o motor com material derretido", explicou à BBC David Rothery, especialista em vulcões da Open University.
Em um dos incidentes mais dramáticos já registrados, em 1982, um Boeing da British Airways com 263 passageiros a bordo ficou com as turbinas travadas durante vários minutos depois de atravessar uma nuvem de cinzas na Indonésia. Ao perder altitude e sair da nuvem, o material derretido se condensou e se soltou, e os motores voltaram a funcionar.
Tripulantes e passageiros depois relataram que o avião também ficou cercado de faíscas --por causa do fenômeno conhecido como Fogo de Santelmo--, que as janelas foram atingidas pelo que parecia ser areia e que um forte cheiro de enxofre invadiu a cabine, forçando-os a respirar com máscaras de oxigênio.
Com as vidraças quebradas, os pilotos foram obrigados a aterrissar apenas por instrumentos em Jacarta.
Em 1989, uma aeronave da KLM sofreu problemas semelhantes ao atravessar uma nuvem de cinzas vulcânicas no Alasca.
Prejuízo
Segundo Rothery, o incidente resultou em uma mudança nas instruções de emergência para pilotos nestes casos.
"Antigamente, quando os motores começavam a falhar, a prática comum era aumentar a potência. Mas isso só piora o problema das cinzas", explicou.
"Hoje em dia, o piloto desacelera e perde altitude para tentar sair da nuvem de cinzas assim que possível. Uma rajada de ar frio e limpo normalmente é suficiente para limpar e desentupir as turbinas."
Mesmo que não resulte em um incidente grave, a invasão de cinzas em uma turbina faz com que ela seja praticamente inutilizada para futuros voos, de acordo com David Learnout, especialista em aviação do site Flight Global.com.
Em entrevista à BBC Brasil, Learnout disse que isso gera um prejuízo econômico enorme para as companhias aéreas.
"Mesmo que a turbina volte a funcionar, ela perde sua eficiência e passa a gastar muito mais combustível", explicou. "A companhia aérea tem que simplesmente jogar fora esses motores danificados. E o motor responde por um terço do custo de uma aeronave."
Além disso, a maneira como as cinzas atingem o avião altera a forma de todos os seus componentes, segundo Learnout.
Segundo Dougal Jerram, geólogo da Universidade de Durham, as nuvens de cinzas vulcânicas são lançadas na atmosfera após a erupção explosiva de vulcões.
"Se forem lançadas a uma grande altitude, essas cinzas podem chegar às correntes de ar e serem dispersadas pelo resto do planeta, como por exemplo, da Islândia para o resto da Europa", disse. " E é nessas altitudes que os aviões voam."
Fontes: FOLHA - Reuters - BBC ( Compilação )
Nenhum comentário:
Postar um comentário